Aula 1: Imagem e seus usos na história – Da pintura rupestre ao cinema digital

1.Pintura Rupestre

  (50.000/30.000 A.C) As imagens surgem junto ao processo de construção das primeiras habitações, esta vinculada ao processo de domesticação do espaço, são símbolos gravados nas paredes que marcam a presença do ser humano no espaço e o territorializam. A pintura rupestre tem surgimento simultâneo também com a marcação do tempo, onde artefatos lascados marcavam os dias e dai surgiram os primeiros calendários.

2.pandora    É nesse sentido que temos que entender a imagem como parte intrínseca da vida social, não somente arte ou documento, mas suporte de significados. As primeiras imagens também contavam histórias e eram utilizadas para transmitir mitos e cultuar deuses. Através do grafismo passa também a compor os corpos e objetos.

3.jarrografismo   O interessante é que o sentido da imagem sempre depende daqueles que a precedem. Ao observarmos a imagem ela se transforma em uma nova realidade para cada um. Se sentido nuca é o mesmo continuamente, ela se transmuta. As vezes olhamos uma mesma imagem duas vezes e há percebemos de forma distinta em cada uma da vezes. Chamamos este movimento de resignificação que se atualiza pela atividade do receptor de mímesis.

4. pintura inca

   Se analisarmos as distintivas manifestações da imagem ao longo da história encontraremos enumeras formas de representação, técnicas, cores e traços. O universo da imagem é tão amplo quanto a construção da alteridade cultural na face da terra. Cada povo, ou cultura utiliza a imagem de acordo com sua cultura, ou até mesmo para contestá-la.

5. pintura egito Quando olhamos pinturas de povos antigos, como as egípcias, constatamos logo uma diferença de perspectiva. Nos perguntamos então, porque só trabalham com duas dimensões? Os objetos soltos nas paredes. A tendencia ocidental é pensar as outras formas de construção da imagem, como menos evoluídas. Como se os estilos evoluíssem em uma escala linear, da pintura rupestre á computação gráfica. Uma busca insaciável pela imagem que represente melhor a “realidade”.

A desconstrução dessa ideia é essencial para compreender a imagem enquanto linguagem, que comunica os significados referentes a seu contexto.

A representação dos membros do corpo na arte egipcia se dava de acordo com a posição que melhor se podia enxergar. O tronco de frente, pés e rostos de perfil. Até hoje o que se ensina nas escolas é que a representação da arte egipcia não corresponde a realidade. Porém se pensarmos que os faraós eram representados como deuses em sua plenitude, o que era a mais pura realidade egípcia, temos que considerar que as escolas partem de um parâmetro de realidade etnocêntrico.

6. cratera

   Enquanto o ocidente considera a arte egípcia como infantilizada e longe da realidade, a arte grega e romana é vangloriada por seu ideal de beleza. Teve seu forte nas esculturas na representação de corpos humanos “ideais”. Os estudos sobre ótica influenciaram na pintura trazendo a questão da terceira dimensão até então não explorada. È dai também os vestígios dos primeiros estudos sobre fotografia, já havia produção de imagem por um orifício de luz, a imagem era projetada, mas não gravada. Colocadas como simplesmente “decorativas” a história da arte ignora o papel politico que a estética greco-romana compreende, desde a arquitetura dos teatros e templos ás cenas de batalhas representadas nos vasos. A busca pela perfeição reflete também o imperialismo de ambas civilizações.

7. ship viking   Há também um salto na história onde o império romano cai, em função da invasão dos povos “barbáros”. Estes povos, em sua maioria pagãos não fazem parte da história da arte. É muito difícil conseguir referências sobre sua produção de imagens, dificultando o entendimento destas culturas, que hoje são cooptadas e transformadas em filmes de ação. O que podemos ver nesta imagem, uma das poucas que encontrei, são as batalhas, a presença de guerreiros, navios e animais.

8. aus-abor-jmi-08_screen  Outras imagens que temos pouco acesso, são as vinculadas a povos originários da áfrica ou América Latina. Outro exemplo são os aborígenes australianos, com uma tradição desde a pré-história de pintar sonhos e marcar o deserto com os sonhos. Não há distinção entre o território que ocupam em seus sonhos e o qual ocupam quando estão acordados, constroem seu território com as pinturas, e hoje lançam mão destas pinturas politicamente no processo de demarcação de suas terras, contra a exploração de minerais no deserto em que vivem.

9. austr_art3

11A arte cristã da idade média, que nos é mais familiar, devido a colonização europeia, teve grande importância na manutenção do poder da igreja católica na sociedade feudal. Com a maioria da população analfabeta, através das imagens nas paredes da igreja a historia da12. inquisicao bíblia era contada. Havia também a preocupação de expor ao céu da igreja o divino e algumas parte o inferno, ou o sofrimento de cristo, como forma de amedrontar os fiéis. A população que forçadamente foi convertida ao cristianismo, sendo que grande parte da Europa era pagã, acabava sofrendo com a inquisição. A quantidade de imagens referentes aquele período que registram torturas e julgamentos as “bruxas e hereges” é bastante grande e hoje o que representa um passado de massacre, na época representava poder.

10. cristã

13. goticaO estilo Gótico desenvolveu-se na Europa, principalmente na França, durante a Baixa Idade Média e é identificado como a Arte das Catedrais. A partir do século XII a França conheceu transformações importantes, caracterizadas pelo desenvolvimento comercial e urbano e pela centralização política, elementos que marcam o início da crise do sistema feudal. No entanto, o movimento a arraigada cultura religiosa e o movimento cruzadista preservavam o papel da Igreja na sociedade.

La pelo século XIV, surge na Itália um movimento chamado renascimento, que vai marcar o fim da idade média e inicio da idade moderna. O renascimento se pautava num resgate dos valores greco-romanos humanista e naturalista. Estes valores impulsionaram a individualização do homem e sua valorização, uma espécie de antropocentrismo ligado ao racionalismo. Este período também representa o fim do feudalismo e o incentivo a livre competição comercial. A racionalização e a ciência ganham força e a igreja perde sua centralidade de poder.

15. Da_Vinci_Vitruve_Luc_ViatourO homem de Vitruvio de Da Vinci é a representação da simetria do corpo humano e de suas proporções em harmonia com o universo. A centralidade da imagem do homem vinculada as anotações e cálculos e o circulo que representa o universo transmite essa racionalidade cientifica do renascimento. É também neste período que se estão iniciando os processos colonizadores e a imagem tem papel fundamental no estudo do exótico.

O barroco surge como continuidade do renascentismo mas vinculado a uma estética de esplendor exuberante. O tratamento barroco aos mesmos temas que se ocupava o renascimento mostrava maior dinamismo e contrastes mais fortes, além de manifestar uma tensão entre desejo material e as demandas da vida espiritual.

16. 800px-Cortona_Triumph_of_Divine_Providence_01b

17. Rubens_-_The_Consequences_of_WarArte da colonização:

           18. Índice19. a08fig03

Albert Eckout: Representação dos indígenas. Elementos em segundo plano que trazem a paisagem. Documentar o exótico.

Hans Staden: Ficou preso entre os indígenas. Trabalho com gravura. Tema do canibalismo.19eckout

Nesse meio tempo na Europa os artistas e intelectuais se ocupavam do neoclassicismo e romantismo. Movimentos inspirados por um resgate das artes clássicas. E a colonização continuava…

Século XIX

20. 91231-familia-pacheco-1895

Surgimento da fotografia como captura do real. Prova do real. É como se ela torna-se uma cena representável. Tem o poder de trazer o que não esta. De trazer o que já morreu. Imitação idêntica do real.

A ideia de que ela é um processo técnico, sem intervenção do artista. A foto é polemica com relação ao conceito de arte porque historicamente o movimento artístico do século XIX era contra a mecanização. È o contexto em que a fotografia surge como uma quase perfeita imitação da natureza.

21. 60-05Ela é afastada da arte e enquadrada como instrumento técnico fora do campo da criação e da imaginação. Ela é um documento técnico de auxilio a memória. A fotografia está ligada ao realismo e isso era vista de forma negativa ou positiva nos diversos discursos do século XIX. A pintura/gravura era vista como restrita ao campo criativo, nunca atingiria o real. A foto então serve para libertar a arte do real.

22exde01A foto então entendida como produto da naturalidade da câmera, não tem um sujeito. No final do século XIX se incia um movimento de construção da fotografia enquanto arte. Partimos então para uma desconstrução do realismo fotográfico.

A ideia de que a fotografia é uma transformação do real começa a ganhar corpo. Primeiro, toda fotografia exige a escolha do ângulo de visão, o enquadramento é uma escolha, a distancia também.

A fotografia até então sem cores, reduzia a tridimensionalidade ao bidimensional preto e branco.

Isola o ponto do seu contexto de tempo-espaço, tornando-se puramente visual.

A câmara escura não é neutra, a fotografia é arbitraria e manipulada. Tem codificação cultural.

A concepção sobre fotografia então muda, ela deixa de ser simples representação do real e passa a carregar códigos, valores e a opinião de quem a produz ou observa. Ela é a ideia de uma verdade interior que se revela no processo de produção da imagem.

Ao mesmo tempo ela não abandona o traço de realidade, mantendo sua relação com a memória e com o momento em que foi capturada.

Surgimento do cinema, a invenção do cinematógrafo. A versão mais comúm da história é a de que o cinematógrafo foi inventado pelos irmãos Lummiere que exibiram o primeiro filme em 1895 no salão do Grand Café. Um personagem ocultado nessa história, é Delesalle, anarco-sindicalista que foi um dos funcionários dos Lummiére, que foi demitido após ocorrer um erro em um dos projetos de cinematógrafo que arrumava e a história é que as maquinas foram trocadas, e o cinematógrafo que realmente funcionava e que exibiu o primeiro filme era o de Delesalle.

Em 1908 anarquistas começam a questionar a comercialização do cinema e as condições de trabalho dos cinematógrafistas, visto que eram operários. Começam então a fazer filmes que tenham uso “pedagógico” e que sirvam como um meio lúdico de aprendizagem para as classes trabalhadoras. Se iniciam uma série de produções mais críticas e também o desenvolvimento de teoria sobre cinema.

Havia também o cinema de vanguarda, ligado aos movimentos artísticos mais críticos da época. Utilizavam então do ilusionismo para criticar os governantes e a sociedade. A presença forte do ilusionismo e da crítica nos cinemas de Meliés e nas animações de Emile Cohl. A forte presença do dadaismo e do surrealismo nos filmes também relaciona o cinema a arte crítica.

O cinema tem uma guinada relacionada ao cientificismo e ao cinema documentário. Temos o cinema de Jean Vigo que mistura poesia e contestação social. E o cinema do Russo Dziga Vertov, cuja montagem tem papel crucial. Para ele as imagens são uma realidade que não é apreendida no documento bruto. O filme tem uma finalidade que é revolucionária, o de desvelar a verdade que o olho humano não pode ver. A camera é o olhar crítico e capacitado e seu movimento tem que dar conta do movimento da sociedade. A realidade somente se torna apreensível através da verdade e a câmera deve estar presente em todos os lugares.

A proxima guinada é uma passagem ao cinema direto, onde a ideia é suprimir a presença do observador e atingir um suposto imediato. Um cinema mais “leve”, com equipamentos mais fáceis de carregar.

Com o avanço da tecnologia se torna mais fácil filmar em qualquer lugar. Armand Guera, na Espanha, inicia um filme chamado carne de feras, que critica a família burguesa e só vai terminar seu filme 56 anos depois, pois estoura a guerra civil em 1936. A partir dai, Armand decide sair com a câmera para filmar a revolução. O cinema foi muito utilizado pela CNT nesse período, para propaganda e registro da situação de guerra.

Hoje com as facilidades da tecnologia, é possível filmar em qualquer lugar. Mas ainda existe um relação muito forte entre a imagem fotográfica, ou o video e o documento. O fluxo de imagens na sociedade moderna é muito forte e as vezes parece até mesmo saturado, muitas imagens passam sem deixar reflexão. Mas a ideia dessa conversa é pensar os diferentes usos que a imagem pode ter, assim como essa aula é uma montagem de recortes, onde escolhi os autores, obras, acontecimentos e argumentos que ia expor, a imagem também o é. Ela é uma linguagem, uma escolha, uma forma de expressão. E a ideia de aprender a produzir imagem, nos da mais uma ferramenta para colocar nossa opinião e nossa crítica ás outras imagens, aos outros acontecimentos, etc. Através da imagem é possível sentir dor, medo, alegria, é possível informar ou desinformar… A imagem também é poder.